27 de junho de 2007

Comunidade de Santa Rosa e São Pedro, Cruzeiro do Sul - Acre

O primeiro choque térmico foi em Rio Branco: ar da amazônia, pesado e bom. De lá, Cruzeiro do Sul, o segundo maior município do Acre. Fica no extremo oeste do Brasil, região de fronteira com o Peru, cidade boa para comprar redes e mosquiteiros. E farinha de mandioca. Tem muita, com muitos tons e nomes diferentes. De lá, partimos para as comunidades rurais.

Existem mais de 22 etnias indígenas vivendo no Acre, uma delas, os katukinas. Lindos, serenos, fortes e tímidos. A primeira coisa que se nota na aldeia é o silêncio. Absoluto. E o que me choca em todas elas são as crianças: pavor dos brancos. As maiores fogem e os bebês choram quando chegamos perto. Eu tenho impressão de que não é mera coincidência. Mesmo eu, com a minha cara de tupi que até os adultos confundem, não engano os pequenos. Não falam nossa língua, nem mulheres, nem crianças e dessa vez apelei: para me comunicar usei mesmo a linguagem – como diz a Renata – universal! Dos barbantes. Deu súper-certo!

Os katukinas realizam um ritual onde tomam o cambô – liquido extraído da pele de um sapo de rio bem verdinho, um animal sagrado. Um pequeno cortinho na canela, líquido introduzido no sangue e bom, até amanhã, sendo amanhã um lugar que não existe nessa noite. Nessa comunidade indígena (e em outras também), os preceitos comunitários que tentamos sempre passar estão todos embutidos. Enquanto grupo, são absolutamente unidos, apesar de terem dividido a aldeia em 04, para melhor ocupar a terra e evitar a invasão de posseiros. O delírio de qualquer educador comunitário: ver como se escutam, como se respeitam, como respeitam os mais velhos, como decidem tudo, absolutamente tudo, comunitariamente, e como realmente tem introjetado a questão da coletividade superando a do indivíduo. Poderia ficar horas escrevendo sobre o que aprendi com eles.

Santa Rosa e São Pedro são comunidades beira de estrada, sem nenhum atrativo especial a não ser a doçura de seus habitantes. De lá, quase trouxe na mala algumas crianças lindas, como a Helenilza ou o Francisco, a primeira de apenas cinco anos, cega de um olho, cuidando da casa, dos irmãos e da mãe alcoólatra, e o segundo, espancado diariamente por um pai autoritário. A dor da malária me chocou. Três em cada quatro pessoas já pegaram a doença, algumas mais de uma vez, doença tropical, que não merece o investimento em pesquisa como os cremes rejuvenescedores...

Voar de Força Aérea Brasileira é sempre uma aventura. O avião balança, é monomotor, a gente vê a floresta de cima, mas bem de perto. A gente reza, faz o pêlo-sinal, cruza os dedos na hora do pouso, este instável, o avião vai pra lá e pra cá com o vento, parece mais uma pipa. Horas de vôo até chegar na fronteira tripla de Tabatinga (Brazil, Colômbia e Peru) Gente, o Solimões... Eu realmente queria ter palavras.

De lá voamos até Manaus, cidade grande, onde tivemos a “oportunidade” de conhecer o Hospital Tropical, referência mundial em doenças da floresta (tipo a malária, a febre amarela, e muitas outras), uma espécie de HC. Tristes com o caráter da visita, com uma grande baixa na equipe, partimos para Barcelos, no Amazonas. Voamos umas 10 horas do Acre até lá, mas nem uma vez deixei de avistar a floresta, em todos os lados, até o infinito. Passamos por pedaços intocados, nunca antes pisados. A Amazônia é nossa e é demais.

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